Resumo

Preâmbulo

Lista de Figuras

Lista de Siglas

Introdução

Primeira Parte: A fronteira
e a Comunicação

1 Caracterização
do Objeto de Pesquisa

1.1 Identidades
e Espaços de Fronteira

1.2 Cultura, ideologia
e meios de comunicação


2 Contextos de Inserção
do Objeto da Pesquisa

2.1 Fronteiras Vivas
2.2 Pólos de Integração
2.3 Caracterização Geral
2.4 Jornalismo e Mídia
Impressa


3 Abordagem Metodológica
3.1 Táticas de
Aproximação do Objeto

3.2 Passos Concretos

4 Vozes sobre as Relações
na Fronteira

4.1 Uruguaiana-Libres
4.2 Santana do
Livramento-Rivera

4.3 Comparando os
Dois Espaços


5 Caracterização dos Jornais
5.1 Jornais de Uruguaiana-
Libres

5.2 Jornais de Livramento-
Rivera


Segunda Parte: A fronteira
na mídia local impressa


6 Análise dos Textos
Selecionados

6.1 A Fronteira
6.1.1 Preliminar: diferentes
usos da expressão fronteira

6.1.2 Fronteira como
amálgama cultural

6.1.3 Fronteira como
transcendência do local

6.2 O fronteiriço
6.2.1 Nós, ou brasileiros ou
argentinos ou uruguaios

6.2.2 Nós todos
6.2.3 Nós, da região
fronteiriça ampliada

6.2.4 Nós, semelhantes
implícitos


Conclusões

Anexos

Referências




Conclusões


Como fenômeno, a fronteira está presente nas manifestações sociais e nos processos comunicacionais desenvolvidos nos espaços Uruguaiana-Libres e Livramento-Rivera. Entre esses, estão os articulados pela mídia impressa local, incidindo nas diversas práticas comunicativas fronteiriças. Este fenômeno por si só já representa um processo dinâmico, e, sobretudo, um processo de comunicação, caracterizando um trabalho constante sobre a realidade e os atores envolvidos.

São vários os Campos Sociais perpassados pela fronteira, assim como são várias as formas como ela é representada nos diferentes textos, que compõem os principais jornais que circulam nas áreas de divisa entre o Brasil e os seus vizinhos no Sul do continente latino-americano, mobilizando sentidos distintos no leitor. As notícias e os textos dos periódicos, tanto os opinativos quanto os informativos, estimulam sentimentos de amizade, irmandade, diferença ou rivalidade, através das estratégias e dos modos de operação próprios do fazer jornalístico.

O indicativo inicial que deu sustentação à interpretação apresentada neste estudo tem como base a Hermenêutica de Profundidade. A adoção dessa proposta teórico-metodológica abriu o caminho para ampliar a análise e aprofundar a reflexão, articulando marcos referenciais de modo a tornar viável a busca de respostas esclarecedoras para os questionamentos, surgidos no desenvolvimento do trabalho. A descoberta de novas questões culminou na definição de dois eixos centrais - a fronteira e o fronteiriço - nas relações sociais, presentes e também propostas pela mídia local.

Foi também de fundamental importância ter verificado, junto à comunidade e às instituições da fronteira, como o fronteiriço se manifesta culturalmente, transmitindo valores e comportamentos próprios de quem habita uma linha muitas vezes tratada como "marginal". Linha esta que se torna "móvel" à medida que oscila entre o local e o internacional, dependendo da situação e da necessidade.

Neste ambiente complexo e ativo, transita um indivíduo que precisa permanentemente se afirmar, distinguindo-se de um outro. Move-se alternadamente da posição de diferente para a de semelhante, no intuito de estabelecer "quem sou eu, quem é o outro, quem somos nós". E, para tanto, tem de saber quando e como fazer este movimento pendular, sem transformar o fato de partilhar o mesmo espaço em algo insustentável, insuportável. O fronteiriço reconhece as situações que o tornam quase um irmão-hermano, mas não nega a existência de tensão na relação desse nós. Por isso mesmo, como conhecedor da dinâmica interna do espaço, ele tem que ser um agente ativo, participativo e presente nas decisões que envolvem o seu viver, construindo, descrevendo e fortalecendo posições, encontrando soluções para que este "conviver com a diferença" seja algo possível.

As conotações que recebe o espaço fronteiriço são variáveis e circulam de acordo com a necessidade dos acontecimentos e atores envolvidos. Conforme a ocasião, a fronteira é percebida - e dita - como um espaço local, incluindo habitantes de ambos os lados da linha divisória como iguais. Em tais circunstâncias, o eu e o ele passam a constituir um nós fronteiriço. Nestas condições, o que se apresenta é uma comunidade diferenciada, que, através de seus atos e falas, demonstra como é possível existir uma integração efetiva entre povos de diferentes países que co-habitam em um mesmo espaço, construído pelo grupo - espaços esses denominados por nós pelos binômios Uruguaiana-Libres e Livramento-Rivera .

A vida na fronteira passa constantemente pela afirmação do eu e, conseqüentemente, pelo reconhecimento do outro. Os de lá e os de cá constroem a relação, estruturam o espaço como sendo de ambos. A flexibilidade existente na fronteira, constituída a partir de um jogo complexo, envolvendo a aceitação e a diferenciação do outro, é um fator que torna o espaço local propício a que outras manifestações culturais se apresentem, abrindo caminhos para mostrar seus vestígios de modo a buscar legitimidade através do convívio mútuo. E isto fica visível nas páginas dos jornais locais que veiculam, lado a lado, textos em português, em espanhol e em árabe, além de expressões do "gauchês", procedimento aceito pelos leitores fronteiriços.

Neste contexto, as identidades se sobressaem e se fortalecem a partir da visão que cada um tem do outro. Os valores e as características que diferenciam os elementos que transitam e dividem o espaço como território de boa convivência servem para reforçar as marcas identitárias de cada um dos grupos envolvidos. Em todos os momentos, mas sob diferentes manifestações e formatos, o outro está presente na consciência e nas falas dos fronteiriços.

Quanto à convivência, os povos vizinhos estabelecem contatos que intensificam o sentimento de amizade e irmandade ou chegam a outro ponto onde fica destacada a tensão, momento de estremecimento dos sentimentos entre eles. Tais dificuldades são vencidas para que seja possível viver harmoniosamente na fronteira, jogando para outras esferas, ou amenizando, as situações de conflito mais graves entre os vizinhos.

O habitante das linhas divisórias de seu país, ao sentir-se isolado da nação da qual faz parte, e distante dos centros de decisão, se apóia no outro que conhece e está geograficamente próximo, que se torna um semelhante, bem mais importante do que seus compatriotas. Reconhece no outro fronteiriço um amigo, um irmão-hermano, que o compreende mais do que aqueles que desconhecem as dificuldades próprias à vida na fronteira, apesar de partilharem com ele a mesma nacionalidade.

Mais do que "um pouco de tensão e muito de integração", os fronteiriços têm de conviver com uma dualidade estrutural, para a qual ele gera estratégias complexas como: serem iguais, mas diferentes ao mesmo tempo; serem locais mas também internacionais; serem platéias das decisões tomadas por seus países (e estados) e habitarem o palco dos acontecimentos relacionados àquelas decisões; serem irmãos-hermanos, mas também o outro.

Sendo assim, os modos de viver e de tratar os acontecimentos vão da amizade e da irmandade à tensão, ao repúdio e ao desprezo, servindo para reforçar momentos considerados pelo fronteiriço, como específicos. Neles, determinados aspectos são ressaltados, dando destaque aos pontos diferenciais que distinguem a fronteira de outros espaços que não os de contato entre países. E esta oscilação vai do nós, fronteiriços ao eles - ou brasileiros, ou argentinos ou uruguaios - que passam a ser considerados estrangeiros, turistas ou visitantes. O homem local constrói, a cada dia e em cada relação, o apoio ao e no outro, realizando isto pelo fortalecimento da diferença ou pelo reforço das semelhanças.

Símbolos como a Ponte e o Parque (uma propriedade relativamente comum) estão presentes no pensamento e nas falas dos agentes locais, representações que definem o espaço como de passagem, de trânsito, de fluxo constante entre os moradores de ambos os lados dos marcos divisórios. Da mesma forma, o fronteiriço cria elementos e instituições que fortificam o pensamento de integração efetiva, como é o caso da Comissão Binacional do Meio Ambiente, em Uruguaiana-Libres, e da Associação Cristã de Moços/Asociación Cristiana de Jóvens Fronteira, em Livramento-Rivera, que traz no próprio nome as duas línguas faladas na região.

Em alguns momentos, o espaço passa a ser designado como lugar internacional. Situações como esta ocorrem, na área de esportes e da cultura, em eventos ou instituições, que, por envolverem povos de países distintos - brasileiros e argentinos ou brasileiros e uruguaios ou as três nacionalidades -, passam a assumir um status de maior abrangência e/ou relevância.

Esta estratégia, de tornar aquele espaço uma área binacional ou internacional, serve também para executar outro jogo, o de lançar a outras instâncias problemas e dificuldades que estão ocorrendo no local, minimizando as tensões entre o nós, fragmentado no eu e no eles. É comum ocorrer este movimento quando o evento beira o conflito. É o momento em que o fronteiriço atribui a responsabilidade dos fatos às esferas distantes, detentoras da incumbência de responder pela soberania nacional. Assim, a questão deixa de ser local, e, através do chamamento a instituições das instâncias federais, é solicitada uma negociação de modo a encontrar soluções em nível internacional, minimizando um possível desconforto no âmbito local. É o que ocorre, por exemplo, nas crises geradas quando surgem focos de febre aftosa naquela área ou com relação à comercialização de arroz entre os países do Sul da América Latina.

Por seu turno, às vezes, também os fronteiriços utilizam-se da estratégia de considerar aquele espaço como regional, assumindo dois formatos. O primeiro é usado para mostrar que a região diz respeito tanto às áreas que compõem o território brasileiro e gaúcho como aos espaços que fazem parte da Argentina ou do Uruguai, isto é, nós, os fronteiriços de cá e eles, os fronteiriços de lá.

A outra forma de tratar a fronteira como regional é excluindo os povos que habitam o outro lado da linha divisória, incluindo apenas os elementos de um mesmo lado, ou seja, nós, os gaúchos ou nós, os correntinos ou nós, os riverenses. Com esta artimanha, os habitantes que ocupam as áreas limítrofes passam a se diferenciar também dos demais componentes de suas nações - brasileira, argentina e uruguaia respectivamente-, isolando-se daqueles que não têm a experiência de viver na fronteira, nas margens, nas bordas de um território nacional, convivendo em constante negociação com representantes de outra nação.

São procedimentos distintos, articulados pelos agentes locais, dos mais variados Campos Sociais, que reforçam as características da fronteira. Os textos jornalísticos das mídias impressas produzidas em Uruguaiana, Paso de Los Libres, Santana do Livramento e Rivera, deixam pistas sobre onde essas estratégias podem ser confirmadas. Tais articulações nada mais são do que mecanismos acionados no sentido de encontrar recursos que viabilizem a vida do fronteiriço de modo a atender as necessidades engendradas pelo cotidiano dos habitantes daquelas comunidades.

Para melhor compreender e analisar o que se passa na formação deste contexto, com linguagens e comportamentos próprios, nas mesclas culturais, nos deslocamentos e saltos do local ao internacional, entre o nós, como um único conjunto, formado por elementos distintos, ou o ele e o eu, vistos separadamente, foram extraídos textos dos periódicos O Jornal de Uruguaiana, - que possuiu como contraponto El Interior -, e A Platéia, que teve em Norte o veículo que serviu de exemplo comparativo na cidade vizinha.

A mídia impressa configura-se, ao mesmo tempo, em palco e em agente dos acontecimentos locais. Através de seu produto - o jornal, ela documenta as práticas e os movimentos que vão definindo as tramas do tecido social. O espaço urbano facilita estas constatações, já que os entrelaçamentos produzidos no âmago das cidades fronteiriças são muitos, devido às inúmeras trocas e contatos realizados no cotidiano, onde a mídia busca diariamente sua matéria-prima. Mas mais do que isto, a mídia é um ator importante de articulação daquele espaço, porque uma parte substancial do jogo estratégico se desenvolve no seu discurso, nas suas matérias, sintonizando-se com as táticas privadas do fronteiriço. A mídia possui uma ampla dimensão simbólica, sua relação se processa com a produção, o armazenamento e a circulação de mensagens significativas para os indivíduos que as produzem e aqueles que as recebem.

Verificou-se que o jornalismo colocado em prática nos contextos analisados não é exatamente aquele desenvolvido nos grandes centros urbanos, possuindo peculiaridades. A construção dos textos que compõem os jornais locais, principalmente O Jornal e A Platéia, estão impregnados da relação direta que o leitor tem com os repórteres, cruzando a todo momento o seu caminho e dirigindo-se a eles como que sendo íntimos.

Atendendo a políticas e filosofias próprias de atuação das empresas jornalísticas incluídas no estudo, verifica-se que a formação do quadro de comunicadores é diferente em A Platéia e O Jornal se comparada com de El Interior e Norte. Nos primeiros, o número de novatos no Campo Jornalístico cria um diferencial entre estes agentes e seus vizinhos uruguaios e argentinos mais acostumados com as diretrizes do fazer jornalístico.

Através das diferentes formas e textos produzidos pelas indústrias midiáticas e estampados nas páginas dos periódicos fronteiriços, foi possível detectar modos de operações e estratégias capazes de demonstrar como a ideologia se manifesta reforçando, criando, reproduzindo determinadas práticas sociais, estruturando a comunicação como um processo, cujas mensagens circulam por canais de idas e vindas, demonstrando a ressonância e a importância dos jornais locais para a comunidade.

Ao articular formas simbólicas específicas, a mídia cria sistemas de representação capazes de concretizar ideologias de modo a auxiliar na manutenção da vida na fronteira, protegendo os habitantes locais de enfrentamentos mais graves, que possam desgastar a relação com o vizinho e contribuindo para a fixação de normas e regras definidas e aceitas pela própria comunidade como válidas.

Nesta brecha, entra o apelo do povo palestino que habita os espaços analisados. Aproveitando a oportunidade para se afirmar e mostrar a sua cultura e os seus valores, utiliza-se do exemplo negativo de convivência fronteiriça que traz de sua origem para enaltecer os espaços fronteiriços onde a interação é pacífica como nos casos de Uruguaiana-Libres e Livramento-Rivera.

A mídia local - e conseqüentemente seus articuladores - é entendida pela comunidade como sendo um de seus porta-vozes. Nas páginas dos jornais esse leitor se vê como sujeito ativo e personagem indispensável para o desenrolar da vida nos espaços de fronteira entre países. As cenas são familiares, os agentes também.

Articulando produção, transmissão e recepção é possível identificar o processo efetivamente como de comunicação. Os discursos impressos nas páginas dos periódicos representam vozes e pensamentos circulantes no ambiente fronteiriço, divulgando idéias e conceitos, acionando interlocutores que colaboram para a consolidação da sociedade e da cultura fronteiriça. E, para tanto, a todo momento, são realizadas negociações entre os elementos constitutivos do processo comunicacional midiatizado, complexo e dinâmico.

Vê-se que há uma necessidade de mencionar a fronteira constantemente na vida cotidiana e nos textos jornalísticos. Esta especificidade faz com que a comunidade e seus sujeitos sejam elementos diferenciados dos demais. Torna-se uma das formas de valorizar a vida sofrida de quem se desgasta em constantes negociações com o outro, membro da nação vizinha, ou de quem, com freqüência é rotulado de interiorano. Nesse sentido, a mídia local colabora para a formação e consolidação desse eu fronteiriço.

É efetivamente em Uruguaiana-Libres e em Livramento-Rivera que o contato entre países acontece. A ligação se dá por via terrestre, favorecendo e facilitando a passagem de um lado ao outro. É ali, a princípio espaços de divisas, que as fronteiras se borram, diluem-se, sobrepõem-se, e este movimento não é possível em qualquer lugar, além do que requer a criação de condições específicas e pré-disposição constante por parte dos envolvidos.

Uma das formas de acionar os mecanismos de valorização é através da transformação do espaço em área internacional. Os eventos e os atores podem ser descritos de modo a extrapolar a condição que se prende ao lugar, assumindo posições que os elevem ao status de internacional. A mescla no uso de expressões usuais da língua vizinha também é uma das maneiras em que isto se concretiza, até porque ficam de fácil compreensão para quem transita por um espaço de misturas culturais. Os códigos são peculiares ao fronteiriço, revigorando-o como único.

Recorrer à história também funciona como uma estratégia que solidifica as relações fronteiriças, variando o enfoque, dando uma conotação de tradição - ou invenção de uma tradição. Aos fatos do passado cabe a responsabilidade de manter vivos os momentos de tensão experimentados entre os fronteiriços de ambos os lados, para que tenham cautela no relacionamento com o vizinho, como herança dos enfrentamentos entre espanhóis e portugueses na região. Em outras ocasiões, a história é acionada para lembrar a importância da união dos fronteiriços para combater as dificuldades específicas do espaço de divisa entre países, como no evento da "Retomada de Uruguaiana". Em ambos os casos, o recurso utilizado está vinculado ao resgate da memória, para que os movimentos já experenciados pelo fronteiriço não se apaguem, evitando que alguns erros sejam novamente cometidos, colocando em risco o convívio local.

Por sua vez, os textos literários publicados nas páginas dos jornais fronteiriços servem para mexer com o imaginário e os sentimentos do leitor de modo que ele valorize a importância de ser fronteiriço e de desfrutar de um lugar diferente - Fronteira da Paz ou a Ponte da Integração.

Os Campos do Esporte e da Cultura são férteis para propagar a harmonia e as competições amigáveis. Demonstrando que é possível conviver com os representantes do outro lado de forma fraterna, inclusive enaltecendo seus predicados. Por sua vez, o Campo da Economia, geralmente, é por onde se dão os acontecimentos mais tencionados. Disputas entre o comércio, transporte de produtos, bem como produtos de lá e de cá despontam como os principais pontos de ameaça.

O comércio internacional é um dos grandes responsáveis pelas situações de crise no espaço fronteiriço. Enquanto o comércio local, muito comum entre os fronteiriços, "funciona" no sentido de ultrapassar dificuldades como as moedas diferentes em circulação - ou até mesmo com a circulação de moedas instituídas localmente como foi o caso do CECACOR - o MERCOSUL surge como um ente maior, mas que, na verdade, torna-se um desencadeador de atritos, sendo chamado a responder por questões tocantes às transações comerciais, envolvendo produtos que, muitas vezes, são oriundos da própria região fronteiriça. Percebe-se que a referência ao MERCOSUL é mais recorrente nos discursos emanados pelos órgãos estatais e representativos de grandes setores comerciais. De modo geral, para o fronteiriço, as situações onde melhor o MERCOSUL pode ser citado é na denominação de eventos, demonstrando a preocupação com o intercâmbio, com a interação, mas, nestes casos, a denominação dada ao bloco é transferida para acontecimentos culturais e esportivos e não comerciais.

A área de Segurança oscila de um lado ao outro. Por vezes, as forças representativas da lei, da ordem e da segurança nacional são apresentadas como complementares e reforçam a posição de que é possível conviver de modo pacífico. Muito embora fique claro que estão presentes e a postos para qualquer eventualidade, apresentando-se em desfiles como o de Sete de Setembro. Dependendo do tipo e da gravidade da situação, há momentos de constrangimento entre as partes, tendo que tratar com muita delicadeza a questão para evitar atritos que culminem em incidentes que necessitem de intervenção das esferas federais.

Percebe-se tanto no dia-a-dia da vida social como nas matérias estampadas nos jornais, que as relações entre uruguaianenses-libreños e santanenses-riverenses possuem pontos que as assemelham. Por outro lado, existem características que são muito próprias dos integrantes de um e de outro grupo fronteiriço. O espírito de rivalidade é mais forte e mais freqüente no espaço de Uruguaiana-Libres do que em Livramento-Rivera, não deixando de ser um reflexo das diferentes formas de interação estabelecidas entre as nações envolvidas em cada um dos pontos de contato entre os diferentes países.

Partindo do princípio que a interpretação é infinita e conflitiva, outros itens poderiam ter sido selecionados para a análise. Entretanto, entendeu-se que as escolhas realizadas deram conta da proposta deste estudo. Assim, outras questões que surgiram não foram consideradas como relevantes para esta pesquisa, abrindo, assim, a possibilidade de realização de outras investigações sobre a mesma temática e, até mesmo, sobre o mesmo objeto, mas com angulações e enfoques diferenciados.

O que se vê efetivamente nos espaços selecionados para o estudo - Uruguaiana-Libres e Livramento-Rivera - é a concretização de ideais integracionistas no sentido de estar sempre viva a idéia de trocas, de intercâmbios. Mesmo que, para tanto, seja preciso burlar leis e regras feitas por não-fronteiriços.

O espírito integracionista está muito presente nas práticas sociais de ambos os contextos. Em Livramento-Rivera, é mais forte a idéia de unificação, de estabelecimento de um espaço e de uma comunidade comum, interligada através de laços familiares e de amizade. E estes movimentos são produzidos e reproduzidos pela mídia local impressa, demonstrando que este canal serve para reforçar posturas, posicionamentos, hábitos e atitudes, intensificando aspectos que passam a compor a vida do homem local, definindo mais e mais o espaço e o habitante das linhas de divisa entre países e de contato entre povos com designações próprias: fronteira e fronteiriço.

Tal articulação é também criada pela própria mídia. Um dos momentos em que isto se pronuncia é quando ela firma contratos de parceria com empresas jornalísticas pertencentes ao país vizinho, sediadas no outro lado da Ponte. Ou, ainda, quando contrata jornalistas que se deslocam diariamente de um lado para o outro do Parque, para trabalhar em sua sede, produzindo notícias sobre a cidade lindeira, na língua "oficial" do leitor, morador tanto do lado de cá, como do lado de lá.

Através deste tipo de postura, o próprio jornal confirma que é possível estabelecer interações capazes de intensificar os laços e contornar as dificuldades que surgem no dia-a-dia de qualquer relacionamento, assumindo as diferenças, reforçando e ampliando as áreas de interseção.

E, neste aspecto, a vida e a mídia na fronteira servem para demonstrar como as comunidades trabalham arduamente no sentido de forjar a cada momento e em cada ação o espaço comum, reconhecendo a diferença e o respeito pelo outro, seu irmão-hermano, servindo de referência para qualquer processo que vise uma relação entre o eu e o outro.

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